Olá, queridinhos!
Vejam só vocês: neste dia 27 estou completando 622 anos! Pois é... É estranho, eu sei, pensar em séculos de uma existência, mas é exatamente assim que me sinto. Não, não é uma crise de 20 anos, em que o jovem começa a se sentir um velho e pensa que vai morrer logo logo. Eu não. Nasci há 622 anos atrás, na velha e fria Londres, em 27 de fevereiro de 1488. Rodei a Europa algumas vezes, viajei até a Ásia, conheci a América do Norte e, antes de vir para o Brasil, fiz uma última visita à minha terra natal. Um passeio com um ar de despedida, como se não mais pretendesse voltar até ela, nem mesmo visitá-la. E fique claro que isso realmente não faz parte dos meus planos futuros.
Enquanto vivendo no Brasil - entenda-se vivendo como sendo diferente de "vivo" propriamente dito - tenho outros planos, para um futuro não muito distante, para uma vida simples mas brilhante ao lado de alguém que me mereça (ou me aguente).
É interessante considerar esses seiscentos anos, em vez de apenas os últimos vinte e dois dos quais me lembro. Intrigante pra uns, idiota pra outros. Mas, para mim, simples e seguro. As músicas, principalmente, além da arquitetura de alguns locais, algumas regiões de florestas, histórias e culturas antigas, são o que me dão a certeza de ter realmente vivido esses 600 anos.
Lembro dos meus primeiros anos, diante da imponente Floresta Negra. O vento frio uivando nas folhas dos pinheiros, o chão forrado pelas folhas mortas, marrons, lobos correndo no início da noite e alguns garotos correndo, caçando, brincando. Velha infância de jogos e pequenos prazeres!
Depois, com as mudanças da velha mãe, tive de partir e por muito tempo passei vagando mundo afora.
Aventuras incontáveis, amizades incomparáveis. A felicidade que se exprime em minha alma é inigualável a qualquer outra sensação, qualquer outro sentimento. Simples e pura; logo, nem sempre consigo alcancá-la, visto as complicações que geralmente criamos, dificultando a visualização de coisas simples da vida.
Junto comigo poucos caminharam, principalmente durante todo esse tempo. Perdi amigos, perdi amores... Mas todos certamente seguem seu ciclo de vida de acordo com o que lhes é destinado, assim como eu, fadado a viver por longos e longos anos, mundo afora, até a chegada de meus dias. Sei que não estão distantes, mas vários anos ainda passarão diante de meus olhos e certamente muitas mudanças acontecerão até que eu repouse meu corpo e o devolva à mãe Natureza.
Enquanto isso, meus olhos viajam na Lua, guia de minhas noites, de meus sonhos. Passo os olhos nas nuvens ralas de dias de vento frio e elas me lembram o mar. Ah, o mar, paixão maior de minha vida. Por séculos permaneci diante dele, para minha alegria constante. Jamais, entretanto, me afastei a ponto de não mais sentir sua presença. Continuarei assim e, em breve, devo voltar e viver meus últimos dias diante desse azul imenso que nos protege.
Hoje comemoro, enfim, meus 622 anos. Mas não comemoro sozinho - ainda há a Meri, a Margareth, a Dalila, que faria aniversário se ainda estivesse conosco (Deus a abençõe, onde quer que esteja!) e a Angela.
Minha irmã adotiva querida, uma amiga inexplicavelmente presente em todos os meus dias, mesmo que passemos dias sem nos falarmos diretamente, seja por MSN ou Orkut ou telefone, sabemos muito bem o que acontece e o que vivemos. Não sei ainda quantos anos ela está comemorando, não me lembro em que momento nos encontramos pela primeira vez, mas que neste novo muitas coisas boas se revelem diante de nossos olhos, que a vida nos mostre seu lado mais belo, que o prazer esteja presente em nossos dias e que a Lua sempre possa guiar nossos passos. Se os seus passarem a ser tão soturnos quanto os meus, então que possamos mais ainda guiarmo-nos diante dos desatinos e desafios que o mundo nos entrega.
"Ando só como um pássaro voando. Ando só como se voasse em bando. Ando só, pois só eu sei andar sem saber até quando..."
Para encerrar, frase de autoria desconhecida, mas utilizada pelo grande Machado de Assis, escritor desta terra, ausente há 100 anos:
"Ars longa, vita brevis, occasio praeceps, experimentum periculosum, iudicium difficile."
"A arte perdura. A vida é breve. A oportunidade é sutil. O experimento é perigoso. E o julgamento é difícil".
P.S.: O célebre aforismo "Ars longa, vita brevis", atribuído ao grego Hipócrates, pai da Medicina
P.S.: O célebre aforismo "Ars longa, vita brevis", atribuído ao grego Hipócrates, pai da Medicina